COMO SE
COMEMORAR OITENTA ANOS
Ele é um menino de setenta e nove anos. Por que menino? Pelo
entusiasmo, o otimismo, o exacerbado amor à vida. Diz sempre: Tomara que a
prorrogação da partida seja bem longa e o Grande Juiz perca o apito para
finalizar o jogo da minha existência.
Muito religioso, aceita os desígnios de Deus com mansidão. É grato e
humilde. Enfatiza muitas vezes: Eu recebo muito mais que mereço. Não frequenta
Igrejas nem Centros. Faz orações em profundo recolhimento. Em contrapartida,
brinca muito, dá risadas homéricas.
Sem
exagero algum, ele realmente é um workaholic. Não para o dia todo, conserta
tudo em casa e fica feliz quando há algo a fazer, mesmo se tarefa árdua, sábado
ou domingo.
A
união familiar é um dos seus valores mais sólidos. Adora a vida em família.
Saudosista em extremo, tem uma memória peculiar. Lembra de episódios, nomes,
locais desde sua tenra infância.
Homem
intenso, espirra alto, cantarola letras inteiras de músicas antigas. Foi músico.
Quando jovem, tocava Sax Tenor na orquestra de uma cidade onde morou durante
muitos anos. Aluno excelente, desde o Fundamental, contudo leu poucas obras
literárias, até que oito anos atrás, viúvo, casou-se com uma escritora e acabou
sendo seu secretário. Ele brinca: Leio toda sua obra, que passa pelos meus
dedos, quando digito seus originais.
Há
pouco tempo, em uma reunião familiar, suas filhas, que residem no Rio de Janeiro,
disseram com entusiasmo: O senhor vai
completar oitenta anos. Há que se fazer uma grande festa! Ele refugou. Não quis,
seu desejo era outro. Há um ano começara a escrever textos sobre sua vida,
desde a infância. Como disse ele, em entrevista na TV, fora picado pela Mosca
Azul da inspiração. Queria publicar seu livro.
Os
sonhos se realizam. Nosso herói não gosta de ficção. Optou, portanto, pela
Literatura Testemunhal e começou a escrever crônicas e contos sobre episódios
bizarros de sua vida. Publicou alguns no jornal. Os leitores gostaram.
Assim,
dia 18 de maio acontecerá o Lançamento de Do Fundo do Baú (Editora Funpec). O
evento será no Hotel Nacional. Amante do passado, ele começou a rever cenas,
fatos, episódios bizarros de sua infância e da mocidade. Vasculhou seu baú de
guardados e, à noite, varava a madrugada no Computador, relembrando e teclando.
Realmente,
comemorar oitenta anos com um lançamento de livro é algo expressivo. A obra
será um documento vivo de sua rica história. Não são memórias, mas narrativas
de acontecimentos insólitos de sua atribulada vida.
Ele
quis usar uma epígrafe e, ao invés de citar algo de um autor famoso, ele
redigiu uma pequena confissão que, em síntese, é sua minibiografia: “Quando
pensei que a estrada tinha terminado, o horizonte mostrou-me que a caminhada
estava apenas começando.”
Na
Terceira Idade, em geral fica-se nostálgico, relembrando acontecimentos bons e
ruins, que são guardados no cofre silencioso da alma. É uma pena. Confissões
ricas, de vidas interessantes, concretizadas em uma experiência repleta de
sabedoria, vitórias e derrotas, são documentos preciosos. É justamente na
Terceira Idade que escrever é uma função catártica eficiente. Afinal, todo ser
humano é uma prova viva da mais complexa obra da Criação.
Há um antigo ditado que diz: “Metade da velhice é arrependimento”. Não concordo porque nosso personagem tão bem decantado pela Escritora Ely não se enquadra nesse protótipo. Ele é elástico, um homem fora das leis: lei do comodismo, do conformismo, da estagnação em não mais produzir, é um autêntico rompedor de barreiras.
ResponderExcluirO tempo para esse bom cuidador não é determinado. É flexível em todos os ângulos. Quando suas mãos se unem para novos projetos, elas despontam e irrompem para servir, transformando-no num ser pleno, puro.
Aparecida
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