POEMA DO MAIS TRISTE MAIO
Acabou a idade das
rosas!
Das rosas, dos lírios,
dos nardos
E outras espécies
olorosas:
É chegado o tempo dos
cardos.
(Manuel
Bandeira)
Todo poeta é um profeta e a
poesia, profecias sibilinas da vida do pobre homem, neste planeta cruel. Na
estrofe em epígrafe, Manuel Bandeira ainda é otimista, pois cita ter havido uma
“idade das rosas” que findou. Entende-se. Na realidade, ela não existe, nunca
existiu, nós é que, quando jovens, vemos a vida com olhos róseos e criamos
sonhos, ilusões (benditas quimeras!) que mais tarde esboroam, implodem, tudo
movido por força implacável. É bizarro porque o processo se repete
sempiternamente. O adulto é o jovem que amargurou, vinho transmutado em
vinagre, nos anos, pelas mais variadas causas. O amor, os relacionamentos, a
profissão, os ideais, nada escapa à fúria do tempo e de suas traças malditas.
Parece mórbida esta repetição inexorável,
com raras exceções. Por que, mesmo conhecendo o fim do filme da vida, o homem
continua indo ao cinema da existência? Não há surpresas: o final é terrível,
inesperado ou tragicamente delongado por alguma doença. A decadência vem cedo,
os membros ficam mais vagarosos, degenera o sexo, rareiam os sonhos (e às vezes
os cabelos), mudam-se as feições, embaça a pele, aos poucos surge toda uma
síndrome irreversível.
A única explicação plausível é
que o verdadeiro espetáculo não é aqui. Neste mundo conturbado só se dá o
ensaio. Há, no entanto, algo bonito, comovente e lírico. Lúcido, sabendo de
tudo isto, o ser humano ainda se permite alegria, arrebatamento, momentos
felizes. Sabe-se que a felicidade está alicerçada no efêmero, no passageiro. Talvez
o grandioso esteja nesta fragilidade. O destino do homem é belo como as
tragédias clássicas, que têm regras imutáveis pré-estabelecidas, sempre com um
final infeliz. É uma tragicidade bela e digna. Sonhar, mesmo sabendo-se fugaz,
é algo excelso. Sublime porque, embora conheça lucidamente o processo
implacável, o homem tem fé, acredita que, acabado o Espetáculo de nonsense, uma
possível existência eterna, harmoniosa, alicerçada em outros valores, poderá
vir. Assim, apesar deste mundo insólito, repleto de incongruências, falácias e
um macabro festival de absurdos, onde tudo é falaz, transitório, os seres
humanos ainda ousam sonhar, eles, que transitam entre o AQUI e o ETERNO, que
desconhecem. Há algo de grandeza neste pobre animal glabro, racional, que ri e
tem saudade da perfeição que nunca teve. É Cecília Meireles que canta liricamente
estes rastros, pegadas que ficam do apenas almejado. É quando fala, alegoricamente, nos dois
dísticos famosos, abaixo:
Eu
deixo aroma até nos meus espinhos,
ao longe, o vento vai falando
em mim.
E por perder-me é que me vão lembrando,
por desfolhar-me é que não
tenho fim.
A bela Cecília, com seus
lindos olhos verdes e luminosos, nos deixa uma mensagem lírica da grandeza
humana.
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