domingo, 14 de outubro de 2012

DESAGRAVO


DESAGRAVO  
Já se tornou muito comum escrever algo sobre o Professor, no seu Dia. Contudo, nessa época em que a figura do mestre anda tão desgastada, quando o magistério virou profissão de risco, parece-me pertinente uma mensagem de desagravo.
Como se não bastasse, a TV Globo está levando ao ar a minissérie Gabriela, obra famosa de Jorge Amado,  adaptação feita por Walcyr Carrasco, novelista de renome. Por conta mais do adaptador do que do romancista, entre as personagens há um professor, criatura infeliz, que mal ganha para subsistir, canhestro, inteligente, mas totalmente gauche, uma caricatura bizarra de um ser humano, na pior das profissões.
         Nos jornais televisivos há sempre notícias de agressões de alunos aos professores e de vez em quando, algum mestre, não suportando mais, revida os tapas e pontapés.  Muitas escolas são de péssima qualidade, o Ensino é fraco, há professores mal preparados e os jovens raramente se interessam pelo magistério. As causas não são somente a violência que grassa nas Escolas, mas também os baixos salários. 
Sei que os mestres jamais serão desnecessários, substituídos pelas novidades da alta tecnologia, como afirmam  algumas teorias falaciosas. Não acredito em tal tolice e enfatizo que nunca me arrependi pela opção profissional que fiz e até hoje, após ter lecionado durante cinquenta e dois anos, se preciso fosse, faria tudo de novo. Dar aulas, participar do desenvolvimento, da educação e da formação dos jovens continua sendo para mim, uma das mais dignas e nobres  profissões. Talvez o professor seja ainda uma das chaves para minimizar o cipoal caótico de alguns problemas sociais e educacionais. Por isso ele deveria ser levado mais a sério, tratado com dignidade e respeito.
Continuo otimista. Sempre que estou em uma reunião de jovens, ao perguntar-lhes o que pretendem seguir, fazer no futuro, quando alguns dizem que farão Letras, Geografia ou História, começo a vê-los como criaturas especiais, mais espiritualizadas e idealistas, alguém que acredita que pode melhorar o mundo. Sinto neles uma fagulha do fogo de Prometeu, uma dose de quixotismo.
Ora, recebi no final de setembro o Boletim Informativo do Centro do Professorado Católico. Interessante, com várias informações importantes, na última página vem um texto de John W.   Schlatter, famoso educador americano, poeta e filósofo. Senti necessidade de transcrevê-lo, porque sua maneira de ver os professores é a minha. Neste seu dia 15 de outubro, a homenagem é pertinente e soa como um desagravo:
Sou professor.
Fui muitas pessoas em muitos lugares.
Sou Sócrates, estimulando a juventude de Atenas a descobrir novas ideias através de perguntas.
Sou Anne Sullivan, extraindo os segredos do universo da mão estendida de Helen Keller.
Sou Esopo e Hans Christian Andersen, revelando a verdade através de inúmeras histórias.
Os nomes daquele que praticaram minha profissão soam como um corredor da fama para a humanidade: Buda, Confúcio, Moisés e Jesus. Sou também aqueles cujos nomes foram há muito esquecidos, mas cujas lições e o caráter serão sempre lembrados nas realizações de seus alunos.
         Cite-se, ainda, a asserção sábia e complexa do grande Guimarães Rosa, nosso Mago de Cordisburgo: Mestre não é quem ensina, mas quem, de repente, aprende.

6 comentários:

  1. Nos tempos recentes, mais do que em qualquer outro, temos descuidado gravemente da atenção devida aos professores.
    A televisão ocupa um lugar central nos descaminhos dos rumos
    que a infância tem tomado.
    Programas vazios estimulam a publicidade de consumir, enaltecem o consumismo e à alegoria do ter. O ser, não existe.
    Daí, o desinteresse da criança em valorizar os princípios de cidadania. E esta, não vem do lar.
    Nào respeitam os professores, estes quase em extinção.
    Por outro lado, a falta de incentivo aos profissionais e o desrespeito alarmante.
    Alunos, pais e governo: predadores da educação.

    Abraços de Aparecida

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    1. Minha querida,
      Amo seus comentários, sempre tão inteligentes e lúcidos. Quisera eu que homens públicos importantes e autoridades do ensino tivessem a sua cabeça e pudessem fazer algo pela Educação.
      Beijos.
      Ely

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  2. Márcio Tubaldini Lisboa17 de outubro de 2012 às 08:51

    A situação dos Professores, no Brasil, é alarmante! Excelentes textos de Ely e Aparecida!
    Leciono na rede pública estadual há 16 anos. É um absurdo o tanto que os Professores são desrespeitados e desvalorizados! Por parte dos governantes e de grande parcela da sociedade, infelizmente!
    Educação não é prioridade neste país, onde os valores estão invertidos!
    O que será dos brasileiros?
    Como quase ninguém mais quer ser professor, o número já é insuficiente, já se ouve dizer em (pasmem!) "importar professores"... de Angola e outros países...
    Esta profissão não é mais atrativa, ganha-se pouco para trabalhar muito!
    Muitos, como eu, amamos nossa profissão, mas não queremos mais ser vistos como "sacerdotes", "missionários do amor"... Queremos ser ótimos professores, profissão mesmo, com amor, bela missão, sim, mas com condições DIGNAS!
    Sei que é complexo isto aqui no Brasil, com a falta de vontade política, com os brasileiros que pouco leem, com os adolescentes que NÃO PODEM ser punidos (menores de 18 podem praticar TODOS os crimes!!!), famílias desestruturadas (mas o que seria uma família estruturada?), internet mal utilizada... etc., etc., etc...
    E nem greve podemos fazer mais, pois todos nos chamam de "baderneiros"! O governo, a mídia, a sociedade, os pais, os alunos...
    Apesar de tudo, ainda tenho esperança que melhore!
    Agradeço a todos que lerem estes 3 textos e o meu desabafo! Com consciência podemos melhorar! Abraços.

    Márcio Tubaldini Lisboa

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    1. Meu querido,
      Tê-lo como leitor e receber comentários tão inteligentes e lúcidos são privilégios que me encantam. Ribeirão Preto é uma cidade feliz por ter ainda um Professor idealista. Queira Deus que haja outros.
      Beijos.
      Ely

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  3. Nos poucos textos que tenho escrito, sempre uso o bordão "Só a Educação
    Salva." Eu acredito nisso.
    Fui seu aluno e sei de seu otimismo em relação ao ser humano, e a admiro por
    isso.
    Tenho dito que não se pode esperar muito das pessoas, pois, sendo assim, é
    frustração certa; mas também tenho dito que não se pode desistir delas.
    É um paradoxo? Pode ser, mas é assim mesmo: todo mundo pode contribuir um
    pouco para a melhoria da Humanidade, mas não pode muito.
    Esperar muito, até mesmo dos assinalados, seria uma temeridade, um erro de
    cálculo.
    Não por acaso, a Educação se faz aos miudinhos, centavo a centavo, grama a
    grama, por isso uma geração é melhor do que a outra anterior - não muito -
    mas é assim mesmo.
    Assim caminha a Humanidade: de pouquidão em pouquidão é que o homem tem
    salvação.

    Um beijo.

    Waldomiro

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    1. Querido Waldomiro,
      Admiro sua argúcia, sua inteligência. Estou sempre de acordo com suas ideias. O paradoxo que citou é interessante, digno de ser examinado com cuidado. Há, no entanto, uma frase sua , uma asserção discutível: "uma geração é melhor do que a outra anterior"... Diante de uma verdadeira síndrome de problemas terríveis, modernos, principalmente na Educação, é preciso examinar melhor a afirmação.
      Abraço.
      Ely

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