PIRATININGA
Às vezes coisas boas acontecem. A enteada
querida convidou para conhecer sua casa nova, em Piratininga. Consultei a
geografia. O local é um bairro de Niterói, Rio de Janeiro.
Sempre aprendendo. Quando a nave
alçou voo, veio a mensagem da aeromoça: Passaredo significa bando de pássaros.
Fiquei encantada com o substantivo coletivo. Uma hora e quinze depois,
aterrissávamos no aeroporto do Galeão. Do carro, eu observava as belezas da
cidade, hoje Patrimônio Universal. Realmente, o Rio é uma das mais belas
cidades do mundo. Parece um cartão postal diferenciado.
Como nada é perfeito, PC, que
gentilmente nos foi buscar, ia nos orientando sobre as belezas e as mazelas da
cidade famosa. O trânsito, problema globalizado, um pesadelo. Nos morros, as
incríveis favelas, imensas, famosas, coloridas, lembram quadros inusitados,
pintados por algum artista talentoso.
No dia seguinte fomos a
Piratininga. A casa grande, sólida, a praia belíssima, a perder de vista,
inacreditavelmente vazia, apesar do domingo. O mar, um poema azul. Levaram-nos
à incrível Praia do Sossego, de inacreditável beleza. O bairro chique de
Camboinhas, com os Condomínios de luxo, surgiu assim, não mais que de repente,
em poucos anos.
À tarde, após o almoço, eu
descansava, quando me lembrei que levara comigo o livro de Mário Quintana, Nova
Antologia Poética. Lugar perfeito, para ler o grande poeta. Deliciada, fui
lendo os poemas, quando deparei com uma estrofe muito pertinente, todavia
melancólica: “Antes, todos os caminhos iam./Agora, todos os caminhos vêm./ A
casa acolhedora, os livros poucos./ E eu mesmo preparo o chá para os
fantasmas”.
Fechei o livro e fiquei a
cismar, neste reencontro com Mário Quintana. Por que a idade nos traz tantos
fantasmas? Lá fora, o pessoal jovem tocava violão, cantava alegre,
desprevenido... Na mocidade, todos os caminhos parecem róseos, as veredas têm
mais flores que espinhos. E é bom que seja assim. O caminho se faz caminhando.
Não se deve alertar contra possíveis alçapões na vida. É preciso que cada um,
ao encontrar os seus, saiba como enfrentá-los. A teoria jamais é a mesma, a
vida não admite receitas nem rascunho. É ali, no vivendo, no embate.
Continuei lendo Quintana. De
repente, uma estrofe linda: “Cada palavra é uma beleza morta espetada na
página. / Por isso a palavra escrita é sempre triste”... Amarguras de poeta.
Ele, contudo, parece ter esquecido do ditado latino, que afirma: As palavras
faladas voam, as escritas permanecem. Realmente, quem escreve, pratica uma
ousadia. Lembrei-me da ex-aluna querida, que acabou de ler meu romance
epistolar, Cartas a Cassandra: “Perdi o sono, tentando distinguir o real e a
ficção nas Cartas.(...) Confundir os leitores, pobres ex-alunos, é este seu
prazer, seu ofício. Vocês, escritores, propositadamente alteram datas, nomes,
recriam a realidade, embaralham as cartas. Cassandra é você, escrevendo para a
outra para exorcizar seus fantasmas”.
Ah, doce Jacy, não tente entrar
neste cipoal de conceitos. Nem o próprio autor (ou autora) conhece bem os
limites da ficção e/ou da realidade em suas obras. Ele escreve por uma
necessidade ingente, coloca no papel a SUA realidade, alicerçada no
Inconsciente, na sua vida, nos livros que leu, na criatividade. Que leitor poderá delimitar o que
é ficção, o que é real? Acho que só Deus. Talvez,
nem Ele, que tem coisa muito mais séria que fazer.
Ser citada no mesmo texto com Mario Quintana encheu de alegria meu pobre coração ateu. Publiquei-a no grupo dos seus ex-alunos do Vilhena. Espelho,espelho meu: existe alguma ex-aluna mais orgulhosa do que eu?...Beijos, Jacy.
ResponderExcluirMinha querida,
ExcluirMencioná-la em meu texto é tão pouco. De uns tempos para cá, a Internet tem me propiciado contatos enriquecedores com ex-alunas brilhantes como você. É algo tão precioso que breve pretendo abordar este tema controverso. A Internet é um instrumento que pode ser bem ou mal utilizado. É caminho, vereda de possibilidades mágicas , ou arma perigosa. Depende de quem tem acesso a ela.
Beijos.
Ely