TORTURA MODERNA
O exame
chama-se Ressonância Magnética. É uma experiência trágica, da qual jamais se
esquece. Um pesadelo. O paciente, após
preencher um formulário com dezenas de perguntas minuciosas, assina como responsável,
caso algo lhe aconteça. Dirige-se para uma sala branca e fria, não pode usar
nada de metal (anéis, relógio, até grampo de cabelo).
Deita-se em
uma cama. Na parte posterior, uma espécie de túnel. O infeliz é imobilizado
(cabeça, braços, mãos; máscara branca sobre os olhos), tampões nos ouvidos).
Avisa-se que haverá muito barulho (os tampões são inúteis...). Começa a sessão
de tortura.
Pouco mais de
uma hora, com barulhos, ruídos absurdamente fortes, violentando todos os
decibéis possíveis. Eles são variados: batidas de madeira, de ferro, sirene,
apitos de navio, claque, roldanas estrídulas, choques, estrondos. Repetições de
vinte vezes, cada espécie horrífica. De vez em quando, a cama cede uns
centímetros, para frente. Imagina-se que o horror acabou. Ledo engano! Outra
série se inicia, com variações...
De olhos
cerrados, todo o tempo, houve momentos que pensei em desistir: levantar-me,
libertar-me, fugir! Continha-me. Eu teria que voltar e recomeçar tudo...
Comecei a ludibriar a situação. Sem abrir os olhos, primeiro rezei. Não ajudou
muito. Tentei analisar as várias espécies de estalos, ruídos, uns mais surdos,
outros cortantes, metálicos. Após, piorou. A Máquina trepidou como se eu
estivesse dentro de um liquidificador vazio.
Tive uma
ideia, para driblar a tortura: fazer elucubrações do porquê o meu neurologista
me pedira dois exames monstruosos. E do crânio. Ele espera encontrar o que no
meu cérebro? Personagens literárias, monstros rastejantes, alienígenas? E, se,
de repente, um inesperado tumor surgisse?
Fiquei
sádica e metafísica. Conversei com Deus e LHE disse que aceitava a sentença, a
morte. Imaginei o féretro, a partida, o adeus a pessoas queridas... E os sonhos
não realizados? E as pendências? De repente, não mais que de repente, como
disse o Poeta, fiquei otimista. Nem precisei de tomar a injeção de contraste.
Isto é bom ou ruim?
Sou leiga em
Medicina, nada sei de exames e um pouco trágica (para não dizer covarde...),
para enfrentar problemas de saúde. Continuei, em plena guerra dos barulhos, a
inventar meios de sofrer menos. Brinquei, em pensamento, de escanear meu
cérebro... Mas tudo logo me cansava e o inferno não acabava!
Finalmente
fez-se silêncio. Paz de morte, de salvação. Ninguém nada falou. Nem eu. Boca
não disse palavra... Fiz ficção: o médico e a enfermeira, todos se foram e me
abandonaram aqui... À minha sorte! Até quando?! Dali alguns minutos, ouvi a
vozinha agradável da jovem: “O médico está examinando as últimas imagens...
Logo a senhora poderá sair”. Mais uns dez minutos de pesadelo.
Finalmente
libertaram-me, tudo acabara! Sentei-me na
cama, mais pálida que o lençol. Dor de cabeça, olhos pesados, zonza. Fui
pegar minhas coisas e me dirigi para a Sala de Espera. A tortura terminara. Na
minha ignorância, tentava entender o acontecido. Com a tecnologia tão adiantada,
por que uma Máquina monstruosa?! Sem nada entender, questionei com meus botões
se aquilo, o fragor horrendo, tudo não
seria necessário, justamente para instigar, estimular meu cérebro, para ver sua
reação? Curiosidade enorme para ler o Laudo, que só sairia dali alguns
dias. Na data marcada, voei até o local,
abri o grande envelope branco. Lá estava o resultado, o relato, em arrevesada
linguagem científica, com nomes bizarros.
Fui ao
médico, para que ele “traduzisse” aquele linguajar estranho. Ele leu e afirmou:
nada de significativo. Tudo normal para sua idade... Tive vontade de matar o
meu neurologista.
Nenhum comentário:
Postar um comentário