segunda-feira, 30 de julho de 2012


A GRANDE ENTREVISTA

                    Dia dez de julho, às 22:30h, no Canal 20 do Net Cidade Ribeirão, foi ao ar a segunda edição de A Grande Entrevista, com o âncora Antônio Cassoni. Culto, com larga experiência na televisão e no rádio, não foi surpresa o sucesso de Cassoni e seus convidados. Em ascensão, A Grande Entrevista         tem tido um Ibope expressivo, com um público especial, que conhece a diferença entre um programa cultural ou  mero entretenimento.       
                    O convidado do dia 10/7 foi Guilherme Davoli, psicólogo, consultor educacional , empresarial e escritor. Os entrevistadores, Denise Dias, terapeuta infantil , escritora e Regis Vianna, psiquiatra, diretor do Centro de Estudos Regis Vianna. A primeira pergunta de Cassoni, ao entrevistado, já demonstrou o universalismo , a abordagem do tema atual e complexo:  Por que a necessidade grande, em nossos dias, de se procurar psicólogos, terapeutas, a religião, livros de auto-ajuda?
                    Davoli pensa que a razão principal é o volume de cobranças e a perda dos sonhos pessoais, em uma época de globalização, quando o indivíduo almeja o que  todos querem ter, na obsessão do possuir bens materiais, dinheiro e poder.  Em seguida falou-se de outros problemas atuais, como o bulliyng, a terceirização, em suas várias facetas. Davoli , Denise Dias, autora do polêmico livro “Tapa na bunda”, e Regis Vianna deram respostas inteligentes e chegaram ao consenso da necessidade de,  na família, impor limites aos filhos e que a terceirização é sempre uma incompetência.
                    Guilheme Davoli mostrou sabedoria e equilíbrio, com posicionamentos modernos, claros, bem alicerçados na importância do papel familiar. Coerentemente chegou-se a respostas incontestáveis: “A pessoa é inteligente quando resolve problemas”, neste mundo onde se valoriza, às vezes, em demasia, o Q.I. (Coeficiente de Inteligência), em detrimento do Q.E. (Coeficiente Emocional).  Aludiu-se à importância de se aprender a ouvir, antes de posicionar-se, virtude que está desaparecendo. Citou-se, então, o famoso texto de Rubem Alves, sobre o tema.
                    Denise Dias falou sobre a necessidade problemática das pessoas que se tornam escravas do Facebook,  porque não sabem utilizá-lo bem, como instrumento social de crescimento,  ao que Davoli retrucou ser mais sério o que  as pessoas fizeram do Facebook, por ignorância na utilização da rede social , que deveria ser usado para a troca de ideias e de conhecimento.  Com as perguntas dos ouvintes, as participações dos telespectadores, foram surgindo respostas notáveis,  como quando se falou da necessidade moderna de se ter com quem conversar, nesta pretensa Era da Comunicação.
                    Uma das grandes lições da noite foi um alerta importante de Guiherme Davoli, dizendo que a Internet é um instrumento altamente sofisticado e perigoso. Quem não estiver preparado para usá-lo, com certeza se dará mal. Falou também da necessidade da leitura, como caminho de evolução. E Davoli enfatizou a   importância  das crianças escreverem com lápis e caneta,  porque isto ajuda a coordenação motora e a organização psicológica.
                    Enfim, uma hora de conversa inteligente, rica troca de ideias e mensagens.  Professor Antônio Cassoni, que jamais deixou de ensinar, estava à frente, como maestro e mediador. O público só teve a ganhar nesses sessenta minutos na companhia de terapeutas brilhantes. No final, a boa notícia que vem por aí o quarto livro de Guilherme Davoli.
                    Sem dúvida alguma, A Grande Entrevista é um programa que enobrece a Televisão, diverte, ensina, orienta. Parabéns a Cassoni e ao Canal 20, que cumprem a digna  missão de propiciar cultura aos telespectadores.

segunda-feira, 23 de julho de 2012


RECADO
                
                 Na semana passada eu te escrevi,  enfatizando a tua importância e mostrando-te que nada teria sentido, quando escrevo, sem ti. Tu és meu co-autor, meu comparsa. Hoje, no entanto, eu te falo como a um irmão, meu sósia, xerox que somos de alma, de fraquezas e de grandezas misturadas, fazedores de sonhos, perdedores de ilusões, mal informados na arte de viver, na qual somos jogados como em uma louca partida, sem mesmo conhecer as regras do jogo, a arbitragem, limites do campo, o tempo disponível e se há possibilidade de prorrogação.
                    EU sou TU, Tu me és, como diria Clarice Lispector. Se não acreditas, desarma-te, esconde tuas garras e tuas tramas, tira todas tuas máscaras habituais e responde: 
                 _ Nunca te sentiste inseguro, vendo o mundo como um quebra-cabeça sem matriz e de onde roubaram algumas peças?
                 _ Não foste, na adolescência, uma sarça ardente de sonhos, um vulcão de entusiasmo, acreditando que o mundo ali estava para ser conquistado?
                  _ Não te alimentaste do fervor e do fogo com o primeiro amor, para vê-lo logo após te fugir das mãos, como areia em ampulheta maldita?
                  _ Não fremiste com o primeiro beijo, o primeiro carinho, trilha encantada e depois perdida para sempre?
                _ Não foste um Sísifo rolando eterna pedra, construindo castelos de sonhos que eram derrubados pelo tempo?
                _ Nunca andaste sob as estrelas, pelas madrugadas, cego pelas lágrimas que te escorriam pelo rosto?
                 _ Jamais foste traído pela pessoa querida, pelo ente amado, em quem punhas todas as tuas esperanças?
                  _ A vida não te pregou peças, atrapalhando teus planos, frustrando tuas expectativas, fazendo-te de bufão, quando o teu papel era de rei?
                 _ Tu não juraste jamais te apaixonares de novo, quando teu amor morreu, e te viste, de repente, outra vez, inexoravelmente louco de paixão?
                 _ Não prometeste ser forte, heróico, perfeito e sem explicação alguma foste arrastado pelas tuas fraquezas?     
                 _ Não bateste no peito, mil vezes, “mea culpa”, “mea culpa” e de novo teus velhos pecados te possuíram, com fatídica renitência?
                 _Não disseste, apaixonadamente, “Eu te amo para sempre!” e, em um átimo, já havias esquecido a promessa?
                 _ Teus lábios não disseram tantas vezes “sim”, quando teu coração negava, ou tua boca não pareceu mentir o que deveras sentias?
                 _ Não tiveste, como o Cristo, o teu Gólgota?
                 _ Não sentes, ainda hoje, apesar de todo o Absurdo, uma obstinada Esperança?
                 _ Não continuas servo da Morte, todavia um amante pertinaz da Vida?
                  Se nunca experimentaste isto, se jamais conheceste esta rota, se achas que digo loucuras, se és diferente, então vai embora, teu lugar não é aqui. Não és um ser humano.
                  
                    

segunda-feira, 16 de julho de 2012


CARTA AO LEITOR

            Permite-me usar a segunda pessoa do singular, tratamento íntimo, mas afinal tu és meu amigo; mais do que isto, és meu colaborador, meu co-autor. Explico-te. Escrever não é um ato solitário; é uma obra a dois, uma parceria, um passo de dança. O autor e fruidor se completam. Se eu escrevo e tu não me lês, não tem sentido e eu me torno um João Batista a pregar no deserto, um semeador sem sementes férteis.
            Muitos autores já se queixaram do silêncio do leitor, que não tem voz e não diz o que sente diante do texto, não participa. Acho que o mais importante, porém, é que este nosso comparsa na sombra, este amigo esconso nos leia, compartilhe conosco nossas dúvidas, nossas procuras. Penso que nenhum ser humano ensina nada a ninguém, ele apenas divide experiências, conta (ou canta) seus sentimentos, emite juízos, faz comentários, tem a coragem de desnudar o espírito diante de um público aparentemente abstrato. É apenas uma troca: uma das partes pode ser silenciosa (o leitor), o receptor, o fruidor), mas não passiva. Leitura é como aprendizagem: é um trabalho a dois.
            Tu que me lês (se lês) talvez possas achar-me às vezes hermética, prolixa, exagerada, incongruente, mas nunca alienada ou desinteressada pela vida, pelos seres humanos, suas lutas e perplexidades. Eu, assim como Cristo, não gosto de purgatórios, de gente morna, esquiva, insossa. Prefiro pessoas que lembram a frase de Shakespeare: “Para ser verdadeiramente grande, é preciso não vibrar sem grandes razões, mas é preciso também lutar por uma palha, quando a honra está em causa”.
            Não quero te dar conselhos: só os tolos e os ingênuos pensam que eles têm alguma serventia. Mas, pensa bem: a vida é linda quando tu és bem tu; quando és singular, dizes algo diferente, original, abres a alma, tiras a máscara, fazes uma conquista. Há pessoas que são chavões ambulantes, são parentes do óbvio, do esperado, jamais surpreendem. Quando o homem parar de ter medo de confessar o que lhe vai na alma, tudo poderá ser diferente, as separações diminuirão, as ligações serão mais abundantes e duradouras.
            Um psicólogo famoso disse que todos temos o direito de “enlouquecer um pouco, cada dia”. Não tomes essas palavras denotativamente. Ele quis dizer que todos os dias temos direito de reservar algum tempo para nós próprios, desvestindo as nossas máscaras dos papéis que representamos. Eu seria mais específica. É no amor que devemos experimentar tais loucuras, tornarmo-nos transparentes, abrir os corações, ofertá-los com paixão, sem restrições. A alma não nasceu para jaulas. O amor também não. Chega de tanta estratégia, fingimento, guerra fria. No amor, a batalha é sempre corpo-a-corpo, de coração aberto. Tempera tudo isto com muita sinceridade, bastante fantasia, uma pitada de lirismo, outra de sensualismo, um pouco de lágrimas, arrebatamento, fogo e talvez tu descubras a receita da felicidade.
            Não sei por que te digo todas estas coisas, a ti, meu leitor silencioso, companheiro de domingo. Não era bem carta, mas um bilhete. Não leves nada a sério do que vai acima e apenas continua lendo o que te escrevo. Porém, não te esqueças da mensagem de hoje, que realmente eu queria te enviar: eu não vivo sem ti. O escritor só existirá se ele tiver leitores que o leiam. Os dois são uma dupla, uma parceria, uma conspiração. Isto é verdade. O resto é literatura.
                       

terça-feira, 10 de julho de 2012


TAPETE DE SILÊNCIO
                                      
        Menalton Braff é, sem sombra de dúvida, um dos mais importantes romancistas brasileiros atuais. Conseguiu concretizar o sonho de todo escritor: dedicar-se integralmente à Literatura.  Assim se explica, além do talento inquestionável e a criatividade fértil, seu sucesso como escritor.  Tapete de Silêncio (Global Editora, SP, 2011) é seu décimo oitavo livro publicado. Em 2000, conquistou o Prêmio Jabuti__Livro do ano, com a coletânea de contos À sombra do cipreste. Várias vezes Menalton foi finalista dos mais importantes prêmios da literatura brasileira.
        A narrativa se passa no povoado Pouso do Sossego. O nome do lugar já é uma metáfora, pois nesse microcosmo vivem as personagens  principais e as secundárias, no seu mundo repleto de medos, cismas, dúvidas. A trama se inicia com dez homens reunidos no coreto da praça da Matriz. Por que a reunião? O que pretendem fazer? Liderados por Osório, esses respeitáveis senhores de bem têm um dever a cumprir: manter a ordem e a honra do lugar onde vivem. Bizarros executores de sentença lavrada por um pretenso juiz. Os acontecimentos da noite trágica são narrados em capítulos e Coros: os primeiros narram fatos atuais, contados por Osório, em primeira pessoa; os segundos, com foco narrativo em terceira pessoa, elucidam episódios do passado.
       Ao longo do romance,  presente e passado se misturam, em um jogo de sombra e luz. As ações do presente se passam à noite, sob a chuva e o frio; sombras e vultos, ódios e rancores,  tudo compõe o quadro sinistro. A chegada à cidade de ruidosa e alegre companhia circense é o vetor que desencadeará os fatos macabros.  O autor desnuda, com maestria, os subterrâneos do poder, alicerçado na hipocrisia, na intolerância, nos falsos valores.  Poder-se-ia afirmar que Pouso do Sossego é a peça nuclear do romance. Como é denunciado na orelha do livro,  a pequena cidade se arvora a defensora da tradição,  moeda de honra do lugar, que deve ser mantida com a paz dos cemitérios.
       Manalton Braff  sempre se realçou, em toda sua obra,  como um estilista, exímio conhecedor da língua portuguesa, autor que se preocupa não só com o conteúdo, mas também com a forma. Em Tapete de Silêncio, os capítulos são narrados pela personagem principal, Osório. Por isso, provavelmente, há uma espécie de licença gramatical, com  uso repetido da próclise, no início da frase e o emprego de corruptelas, como “pra” e algumas expressões coloquiais,  talvez para enfatizar a oralidade na narrativa.
       Inteligente e sobriamente, tiradas filosóficas sobre os seres humanos, a vida e a morte, são inseridas no relato. Sobressai a atmosfera de mistério que antecede o crime, assim como a intrigante personagem da velha desconhecida, que arrasta seu anonimato e sua miséria, “distribuindo sua tosse por onde andava” e é encontrada morta na escada do coreto. Este mistério não é desvendado, o final do livro é aberto e também o crime hediondo, com a morte do sedutor, o assassinato em defesa da honra fica impune.  É Osório que afirma: “A cidade toda, se pudesse saber o que se passou, apoiaria o que fizemos. Pelo menos as pessoas de bem desta cidade. Um crime , mesmo um crime de sedução, não pode ficar sem castigo. E severo para que sirva de escarmento”.
      O romance Tapete de Silêncio é uma obra densa, que envolve o leitor em um mergulho nas regiões abissais da alma humana.