VISITA INESPERADA
O homem procura a felicidade com obsessão. Talvez ela não
exista, ou esse pobre macaco glabro erre nas opções. Vicente de Carvalho
eternizou a problemática, quando diz: “Essa felicidade que supomos, / árvore
milagrosa a que sonhamos / Toda arreada de dourados pomos, / Existe, sim, mas
nós não a alcançamos / Porque está sempre apenas onde a pomos / E nunca a pomos
onde nós estamos.”
Muitos incautos pensam em encontrá-la em coisas materiais, como
dinheiro, bens, ou na fama, no poder. Tudo é efêmero e traz, no final, o
ressaibo do tédio e da desilusão. Não é apenas na sede de poder, mas em todas
as ambições, é preciso lembrar sempre que, acima de cada cabeça obcecada há,
perigosamente, uma Espada de Dâmocles.
Ora, a idade madura, às vezes vista como castigo, traz
alguns privilégios e um deles é reconhecer os valores essenciais, ter uma
espécie de feeling para o que realmente é importante na vida. Uma boa opção
talvez, sem exageros, é ser presentista, viver à exaustão, o momento presente.
Admirar a filosofia de Horácio, o Carpe Diem, ver com acuidade, certos frutos
doces e magníficos, como colheita de uma seara lúcida e aureolada de sonhos.
Sabe-se que a experiência é ao portador, porém diante de
tanto ceticismo, ouso relatar uma descoberta que talvez possa embelezar um
pouco a complexa vida moderna.
Troquei uma vida de quarenta e sete anos, em apartamento,
sempre por segurança e praticidade e vim para a minha Pasárgada: casa ampla,
com clima mais ameno, muito verde e logo se formará um jardim ainda em projeto. Chego a
ver as buganvílias de cores variadas enfeitando as cercas frescas de murta;
virão as gérberas, as prímulas, rosas e árvores ornamentais como os ipês, um
flamboyant, as quaresmeiras de roxo vivo, acácias e um gracioso chorão. Ao
redor da piscina muito azul, os coqueiros anões, com sua alegria tropical. A
horta de tenras folhas, o futuro pomar pejado de frutos doces.
Os animais completam a beleza harmônica e transformam o
local em um santuário ecológico: duas cadelas labradoras, cor de chocolate, de
lindos olhos verdes, curiós, cujos cantos são puro violino, com suas femeazinhas
à espera de gala, os beija-flores visitam o pequeno bebedouro de água açucarada,
borboletas várias, de cetim, enfeitam a tarde. Em uma árvore vizinha, quatro
maritacas jovens, ruidosas e um sabiá. Bem-te-vis coloridos saltitam e se
aproximam, em meio a uma enorme variedade de pássaros. Gaviões voam, dando um
toque de mistério e de perigo, enquanto soturnas corujas, estátuas imóveis, filosofam
ao anoitecer. A beleza e a paz alimentam
a alma.
Há pouco tempo, uma visita pitoresca, muito inesperada: um
mico estrela tem vindo comer a banana que deixamos para ele. Domingo de manhã,
na sua galanteza, fez-nos uma visita. O irrequieto amiguinho deve morar nas
matas cerradas, cor de jade, que bordejam o rio, aqui perto.
Namoramo-nos de longe, eu encantada, ele arisco e
cuidadoso. Pela hora inteira que estivemos juntos, tão próximos, chego a crer
que ele voltará. Deixei-lhe, então, junto às frutas, um recado: “Volte sempre.
A casa é sua”.
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