domingo, 30 de outubro de 2011

ADEUS A DJALMA CANO

ADEUS A DJALMA CANO
                       Tenho muita dificuldade de enfrentar mortes de pessoas queridas. Quando elas são muito idosas, é um pouco mais fácil. Todavia, quando morrem prematuramente, tenho a impressão que houve erro no calendário de Deus. Sei que isto é meio herético, mas como entender quando são jovens, ou antes dos setenta anos?
                       Amigos, alunos, meu sogro, uma tia, um tio, meu pai... Ele se foi aos sessenta e quatro anos, em 1974, um homem forte, dinâmico, verdadeiro mastro de navio, alicerce, porto.
                       Dia 17 de setembro, recebi um e-mail da escritora Jair Ianni. Ela, infeliz, tristíssima, comunicava-me a morte de Djalma Cano. Fiquei chocada, nada sabia de sua doença, da cirurgia. Sessenta e quatro anos! Lembrei-me do Djalma inteligente, sensível, excelente professor, escritor, cantor, poeta e dramaturgo.
                       Ainda sem nada entender e aceitar, peguei o livro “Sarça Ardente”, do Grupo Flamboyant, Funpec Editora, 2002, abri na página 23. Djalma Cano: Médico, professor de medicina, ator de teatro amador, editou seu primeiro livro, “É poetempo de poesia”, em 1997. Tem três livros de poesia e um de contos, no prelo. Participou da Antologia “Uni/Versos” (1997), do Grupo Flamboyant. Está na coletânea “Poeta de Gaveta”, nº 6, editada pela Universidade de São Paulo, “campus” de Ribeirão Preto, com o conto “Silêncio”, em 1999. Foi premiado com o primeiro lugar do 1º Concurso Literário de Poesia e com o primeiro prêmio do 1º Concurso Literário de Conto, ambos do Centro Médico de Ribeirão Preto, em 1999.
                       Eu não conhecia bem o cidadão, o Dr. Djalma Cano, seus familiares. No seu dinamismo, Djalma era membro da Alarp (Academia de Letras e Artes), lecionava na Universidade de Ribeirão Preto (Unaerp). Ator, apresentou a peça “Conc(s)erto de Senhoritas”, com o grupo teatral Boca no Trombone, em agosto de 2011; integrou o elenco de “Chá de Caridade”, comédia da Companhia Serotonina.
                       Eu admirava muito o poeta; seus poemas eram ricos de um sensualismo belo e lírico. Na citada Antologia, “Sarça Ardente”, Djalma demonstrou ser um exímio contista, explorando o gênero do miniconto, tão em voga hoje. O miniconto é uma condensação artística de criar, em poucas linhas, uma grande história.
                       Ele publicou nesse livro quinze minicontos, mostrando-se uma grande maestria em condensar um conto em tamanho reduzido, onde se pode ver a ousadia, o sonho, a posição social da personagem, a tristeza e o desencontro dos pais. O final aberto, moderno, tudo faz do miniconto “Partida”, uma pequena obra-prima.
                       Waldomiro Peixoto, escritor e poeta, que também pertencia ao Grupo Flamboyant, enviou um e-mail melancólico e delicado. No texto, palavras sensíveis: “Nem sei o que dizer. As partidas prematuras são sempre dolosas. O Djalma estará de mãos dadas com a Herbênia e com a Silvinha, do Grupo Flamboyant. Todo homem é mortal, mas nem todo o homem é mortal. O Djalma continuará vivo no coração e mente de quem o conheceu de perto”.
                       Se todos ficaram muito tristes com a sua ausência, deve ter havido festa no céu. Dizem até que Djalma já está escolhendo um elenco de anjos para uma nova peça. E não parou de fazer poemas. Hosana, Djalma Cano!


4 comentários:

  1. MEMÓRIA

    O que acolhemos durante a vida
    é o que amamos.
    E o que amamos se eterniza.

    Começa como beijo
    e damos o nome de encontro.
    Como seiva, escorre por momentos
    e se abriga na convivência
    a compor uma grande história.
    E gesta o amor, sempre em construção.
    Em tira de sonhos o desejamos
    como doce eternidade.

    Mas o frágil destino humano
    o transforma em seta no coração.

    Aí, o chamamos saudade.

    (Do livro COLHEITA DOS VENTOS)

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  2. Caro Rossetti,
    Receber visita de grandes poetas, no Blog, é um privilégio. Ainda mais quando o Poeta nos deixa de presente, um belo poema.
    Obrigada!
    Abs.
    Ely

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  3. A dor da perda é intransferível.
    Pelos idosos sente-se uma dor mais consolativa, consciente embora irreparável.
    Ao contrário de quando se é mais jovem, a aceitação
    torna-se mais difícil.
    Em todos os cantos do mundo há abandonos inesperados. Ficamos órfãos dos talentosos e de suas obras. E quando esses talentosos estão muito próximos, a repercussão é indescritível. À princípio tenta-se questionar o porquê. Mas até hoje, nenhuma tradução tenha sido tão enigmática de como retirar-se prematuramente.

    Aparecida

    Cidissima

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  4. Cidíssima, minha querida,
    A Morte será, eternamente, um mistério. Sabemos que ela é inexorável, que virá, sem dúvida, mas jamais nos acostumaremos com as perdas. Gosto muito de um verso de Cassiano Ricardo: "No momento em que se nasce, já se começa a morrer." O Poeta não é pessimista, nem niilista. Ele é realista, pois cita uma realidade inquestionável.
    Beijos.
    Ely

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